Eles logo chegaram à estação de metrô abandonada. Stella começava a dar sinais de desconfiança – e Nicholas, ainda mais bêbado do que sóbrio, parecia achar tudo engraçado. Sua recém-adquirida mágoa em relação a Peter se transformara em uma inconveniente camaradagem:
- Onde foi que você arranjou essa capa bonita? Pensei que couro fosse proibido – e soluçou, sorrindo.
- Não, é sintético – Peter respondeu.
- Ora, não é não – Nicholas tomou a ponta do sobretudo rasgado. – É couro.
- É só uma capa velha.
Nicholas franziu o cenho.- Bem, mas isso pode lhe trazer muitos problemas.
Bruce, por outro lado, acompanhava a inevitável retomada de consciência do pai com ares de infelicidade. Pior do que lidar com um Nicholas bêbado seria lidar com um Nicholas funcionando em sua capacidade total.
Moira aproximou-se de Peter. Olhou para trás, garantindo que sua mãe estivesse longe o bastante para não escutá-la, e perguntou:
- Peter, quem é o seu pai?
Peter não se surpreendeu com a pergunta. Era óbvio, para Moira, que ele vinha esperando por aquele momento. Mas não pôde deixar de sentir-se inquieto.
- Você provavelmente entende por que eu não posso responder.
Moira entendia, mas insistiu:
- Por que não?
- Porque se eu lhe disser que você está destinada a se casar com pessoa A, talvez você não veja pessoa A com bons olhos. Ainda. Talvez – na verdade, muito provável – a revelação atrapalhe a relação que vocês iriam ter e seu eventual casamento. Talvez você acabe olhando para pessoas B e C, e meu destino seria incerto. Chame de egoísmo, mas não sei lidar com isso de outra forma.
- Mas eu jamais... – Moira começou.
- Talvez. O futuro é incerto. Eu já mudei muitas coisas no meu futuro por besteiras menores.
Moira sentiu-se dominada pela súbita vontade de saber de tudo: há quanto tempo Peter viajava? O que ele fazia em outras épocas? Como era o futuro? Tinha certeza de que ele jamais lhe responderia, mas a vontade de permanecer ao seu lado, na esperança de que deixasse algo escapar, era irresistível.
Peter abriu um vagão com a ajuda do próprio relógio de pulso. Os outros perceberam que era um trem moderno, um trem que jamais teria sido abandonado em um lugar decadente como aquele. Stella puxou a manga de Moira com discrição.
- Mas o que é isso?
- Não se preocupe, mamãe. Logo vai estar em casa – era o melhor que Moira poderia dizer.
Peter, tendo arrumado o painel de controle, colocou a cabeça para fora do vagão:
- Bem, vocês vão ficar aí?
Nicholas foi o primeiro a entrar, assombrado. Virou-se para Bruce:
- Você tem amigos estranhos.
- Eu sei.
Deu um tapinha no ombro do filho, e aquele contato enrijeceu o corpo de Bruce. Ele caminhou até onde Peter estava tão logo pôde.
- Como você construiu um trem como o do Wilcox? – perguntou.
- Não construí. É o mesmo. Mas as melhorias não foram feitas por mim, de qualquer jeito.
- Por quem?
- Muitas pessoas, ao longo de muitos anos. Meus pais foram algumas delas.
- E você é parente do professor?
- Não. Eu nunca o conheci.
Bruce não ousou perguntar mais nada. Começava a aceitar o fato de que Peter era um viajante do tempo, e de que estava ali para salvá-los. Mas o que exatamente aquilo significava? Olhou para Nicholas, sentado em um dos bancos, seus primeiros indícios de depressão começando a se manifestar – a cabeça baixa, os ombros largados. Depois para Stella, viva, sem saber que era a primeira vez em muitos anos que reencontrava sua filha. Desistiu de pensar a respeito.