Era Bruce. Ele entrou discretamente, ignorando as muitas perguntas de Moira. Tratou de calar-lhe a boca com uma das mãos tão logo a porta foi fechada.
- Fui parado pela polícia – ele disse; estava mais calmo do que se presumiria.
Moira aquietou-se imediatamente. Perplexa, ela afastou a mão de Bruce.
- Parado? – perguntou. – Como assim? Por quê?
- Não sei. Talvez eu pareça mesmo suspeito. Quando deixei o pub comecei a andar e a andar e a andar. Acabei parando em um parque onde eu costumava... quero dizer, foi inconsciente. É engraçado... – ele começou a rir, mas depois abaixou a cabeça, envergonhado. – Não sei o que houve. Quando me dei conta, uma sirene quase me ensurdeceu e dois homens desceram de um carro que eu nem a menos tinha percebido. Talvez estivessem me seguindo desde sempre.
- E então?
- E então quiseram meus documentos.
Moira mordeu o lábio inferior.
- Isso não é bom.
- Eu disse que estava sem ele. Os dois começaram a rir: “Mas será que alguém realmente anda sem documentos hoje em dia?” Idiotas.
- E então?
- Pegaram a minha carteira. Os MEUS documentos, não os do outro Bruce. Eu soube no mesmo instante que passaria longos anos na prisão.
- Como conseguiu escapar?
Bruce balançou a cabeça.
- Só estavam rindo de mim. E então viram os documentos e entenderam que havia alguma coisa errada. Balançaram a minha identidade na minha cara e perguntaram o que era aquilo. Pensei em pelotões de fuzilamento. Estava visualizando câmaras de tortura – e, por algum motivo, John Hurt.
- Bruce, como saiu de lá?
Bruce fez uma pausa. Sentia-se angustiado como uma criancinha que subitamente descobre que Papai Noel não existe.
- Moira... eu desapareci – confessou.
- Você o quê?
- Eu desapareci. Por um instante, um ínfimo instante. E então reapareci em um lugar completamente diferente.
Ele segurou Moira pelos ombros e com total delicadeza a empurrou até a cozinha. Reduziu o tom de voz a um murmúrio:
- Lembra-se do que Wilcox dizia sobre pequenos problemas que estava enfrentando com as viagens temporais? Sempre quando ele nos encontrava repentinamente? Lembra-se? Eu acho que foi a mesma coisa. Talvez seja um defeito da máquina.
Moira precisou de alguns instantes para pensar. Ela lançou um olhar vago para a pia - a torneira pingava.
- E então veio correndo para cá?
- Vim correndo para cá. Mas não importa. Moira, bem ou mal, eles estão com a minha carteira. Minha identidade pode não fazer muito sentido, mas eles têm meu nome. Eu... eu tenho uma esposa.
- Eu sei.
- Fica ainda pior. Já imaginou o que pode acontecer se isso for levado a... autoridades mais competentes?
- Como assim?
- O misterioso homem que desaparece? Uma carteira de identidade que não está de acordo com a documentação deste presente? E se Gabriel souber de mim? E se a história for parar em jornais?
Uma perspectiva tão absurda não havia ocorrido a Moira. Ela imaginou o que faria Gabriel tendo o conhecimento de outros como ele. Pessoas que poderiam prejudicar sua carreira promissora no ramo dos ditadores.
- Não vão publicar nada no jornal. Eles controlam toda a mídia. Não deixariam uma informação do tipo escapar tão levianamente.
- Eu preciso voltar para Londres. Jessica. Talvez a procurem.
- Mas e o seu pai?
Só naquele momento Bruce se atreveu a desviar os olhos de Moira. Pouco a pouco ele se deu conta de que estava na casa em que havia passado sua infância.
- Minha mãe está aqui?
- Não. A casa estava vazia. Não sabemos para onde ela pode ter ido.
- Vim correndo para cá por instinto. É realmente engraçado que...
Não completou a frase. Notou que alguém se aproximava – era Peter. Bruce o encarou por algum tempo, confuso, e depois se voltou para Moira:
- Todos vão precisar sair daqui.
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